quinta-feira, 30 de agosto de 2007


A aventura de descobrir uma espécie.

Entenda como os cientistas identificam animais ainda não descritos pela ciência!
Foi em uma viagem pelo rio Cururu-açu, no sul do Pará, em 1999. Os ornitólogos Elizabeth Höfling, Marcos Raposo e Renato Gaban-Lima viram um curioso papagaio: quase careca, sem penas na cabeça, ele tinha a pele da região de cor laranja. Os três logo pensaram que se tratava de uma nova espécie, pois as características dele não se encaixavam com as de nenhum papagaio que o trio conhecia! Mas, ao obter dados sobre a ave, descobriram que ela havia sido identificada como um jovem da espécie curica-urubu. "Foi um banho de água fria", lembra Marcos Raposo .
Acima, imagens das novas espécies de peixe, coruja e papagaio que foram recentemente descobertas e descritas no BrasilAnos antes, em 1980, o zoólogo Galileu Coelho coletou, em uma reserva em Pernambuco, duas corujas iguais e as levou para a universidade federal do estado, onde atuava. Lá, elas ficaram sem serem estudadas. Até que, em 1997, o professor José Maria Cardoso da Silva chegou à instituição. Com experiência na Amazônia, ele viu as aves e perguntou: que bichos são esses? Ao ouvir a resposta -- Glaucidium hardyi , presente na floresta amazônica --, duvidou. "As corujas eram bem diferentes dessa espécie", conta. "Propus, então, que fossem estudadas com calma." No mesmo ano, 1997, uma cientista do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) coletou, por acaso, um peixe em um igarapé perto de Manaus. Ele era tão pequeno (dois centímetros) que não dava para dizer se pertencia a uma nova espécie ou se era só a forma jovem e desconhecida de algum grupo de peixes. Para piorar, não podia ser estudado a fundo pelos cientistas, pois era o único exemplar! "Em casos como esse, é prudente manter o animal intacto, como prova de que foi de fato achado", explica Jansen Zuanon , biólogo do Inpa envolvido no estudo do peixe. Essas histórias são diferentes, envolvem cientistas e bichos distintos, mas têm algo em comum: seu final. Todas terminaram com a conclusão de que os animais em questão -- o papagaio, a coruja e o peixe -- eram de uma espécie até então desconhecida pela ciência! Mas os ornitólogos não tinham descoberto que o papagaio era definido como um curica-urubu jovem? Sim! Os cientistas do Inpa não estavam impedidos de estudar o peixe e, assim, confirmar se ele era de uma nova espécie? Pois é. Mas, até aqui, você só conheceu o início das histórias e nem sabe como se descobre uma nova espécie... Uma espécie é considerada nova quando difere de todas as outras que já tiveram suas características descritas pelos cientistas. Essa diferença costuma ser sutil: no caso dos peixes, por exemplo, pode estar no número de escamas ou na forma dos dentes. Por isso, é preciso ser, em geral, um especialista para ter certeza de que uma espécie é nova! Taxônomos e sistematas são os especialistas em descrever novas espécies e estudar suas relações de parentesco. Eles comparam espécies já descritas entre si e podem encontrar exemplares que não se encaixam nas características de nenhuma espécie já conhecida. "Isso leva a estudos que, em geral, acabam com a publicação de um texto, descrevendo a nova espécie, em uma revista científica", explica Jansen Zuanon. Mas o que é preciso analisar para dizer se uma espécie é nova?! Isso é o que você vai descobrir na continuação desta série de textos!

Mara Figueira Especial para a Ciência Hoje das Crianças 12/05/04